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Os perdedores de 1964 constituem a elite dominante hoje, diz Lucia Lippi

20 mar/2014

Lucia Lippi
Lucia: Os eventos 1964 ainda são visto como algo muito próximo. Foto: Peter Ilicciev.

Uma reflexão sobre memória, história e identidade a partir da comparação entre o cinquentenário do Golpe de 1964 e o da Revolução de 1930 deu o tom da aula inaugural da Casa de Oswaldo Cruz (COC), proferida pela pesquisadora Lucia Lippi, da Fundação Getulio Vargas (FGV), no dia 20 de março. Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), ela participou, em 1980, das discussões organizadas pelo Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC), da FGV, para relembrar os 50 anos do evento que encerrou a Primeira República.

Para ela, as sensações relativas aos dois momentos históricos são diferentes. Enquanto 1964 ainda hoje é visto como algo muito próximo, a Revolução de 1930 era percebida em 1980 como pertencente a um passado mais remoto. Embora houvesse diferentes interpretações sobre aquele período, praticamente não havia, em 1980, quem defendesse a Primeira República, afirmou Lippi. “O sucesso dos vencedores tinha sido de tal modo consagrador que não questionávamos o período anterior a 1930. Inclusive a denominação que se dava a esse período era República Velha”, afirmou.

De acordo com ela, de certa forma, essa versão foi “comprada” pelo grupo de pesquisadores no qual estava inserida na época. “A construção ideológica e historiográfica do papel de 1930 foi tão bem tecida que todos nós ‘ficamos sabendo’ que o Brasil moderno tinha começado [então]”, disse.

Lucia vê outras diferenças entre os dois cinquentenários. Ela observou que muitos dos que perderam com o golpe de 1964 estão hoje no poder. “De alguma forma, os perdedores de 1964 constituem a elite dominante hoje. Obviamente, isso esclarece o que vamos lembrar e o que vamos esquecer [sobre aquele período]. Por outro lado, a pesquisadora lembra que os que estavam no poder em 1980 eram continuadores distantes dos vencedores de 1930.

A partir desses fatos históricos e da maneira como a sociedade lida com eles, Lucia discutiu os conceitos de memória, história e identidade. Segundo ela, memória é elemento constitutivo do sentimento de identidade – individual ou coletiva – relacionado ao sentimento de continuidade e de coerência. “Memória individual ou coletiva já foi chamada de ‘ilha de edição’”, disse a pesquisadora.

De acordo com a pesquisadora, Identidades – sejam elas nacionais, grupais, familiares, religiosas, étnicas – envolvem lembranças e esquecimentos. Memória e história, estariam, portanto, envolvidas em diversas batalhas simbólicas pela apropriação de eventos do passado que devem ser lembrados, assim como pela demarcação daqueles que devem ser esquecidos.